Um laboratório que é uma câmara de horrores

Um laboratório que é uma câmara de horrores

Os efeitos médicos do tabaco são tão variados que chegam, só por si, para encher um livro. Vamos limitar-nos, por isso aos efeitos principais e aos que se manifestam à superfície, para não termos de mergulhar muito na bioquímica, na fisiologia e na química.

O cigarro produz efeitos não apenas pelo que contém, mas também pela combustão da mistura de mais de cinco mil substâncias químicas com tabaco e com papel em cada laboratório, escolhidas de entre uma grande quantidade de venenos.

São de mencionar, em especial os hidrocarbonetos policíclicos, tornados obrigatórios para os catalisadores dos nossos automóveis.

O isocianato de metilo, o veneno do acidente de Bhopal, na Índia, também está presente, além do cloreto de metileno (empregado para provocar alterações psíquicas e de disposição e responsável por mudanças de personalidade), do formaldeído (que inibe as enzimas de reparação), do nitrito de metilo (que provoca mutações), das aminas cancerígenas, de substâncias radioativas, como o radão que a planta do tabaco capta na superfície das suas folhas muito fortes (os pulmões dos fumadores irradiam quarenta vezes mais luminosidade do que os pulmões dos não fumadores), e metais pesados, como o cádmio, o chumbo e o arsénico, além de muitos herbicidas e pesticidas em proporções alarmantes.

Nesta perspetiva, é de espantar a capacidade que a planta do tabaco tem de captar elementos externos e de aumentar as suas reservas, sendo talvez a única espécie vegetal que continua a ser realmente imune a venenos externos e sabendo-se que nós próprios temos de recear os efeitos de qualquer toque acidental nesta planta.

https://gauchazh.clicrbs.com.br/economia/campo-e-lavoura/noticia/2018/10/ministerio-da-saude-adotara-medidas-contra-a-doenca-da-folha-verde-cjn66nref04k101pijkkrxgfx.html

Que se passa, então, no laboratório de cigarros, no percurso entre a cinza e o filtro que metemos na boca?

Para começar, e é aí que tudo nasce, está a zona de combustão, onde as temperaturas podem chegar aos 700 graus centígrados. É aqui que arde o tabaco e uma parte dele é gasificada.

O calor da combustão passa para uma zona de destilação livre de vapor de água, que dissolve elementos contidos no tabaco e que se mistura com os gases. Mais longe da zona de combustão está a zona de condensação, mais fria, que força a precipitação da mistura de vapor e de gás.

Se o fogo se mantiver por mais tempo, o processo laboratorial torna-se mais lento e a mistura, que vai ficando cada vez mais pequena na zona da condensação, torna-se mais rica e mais explosiva.

É também por isto que, sob um ponto de vista médico, os cigarros não devem ser fumados até ao fim. Os verdadeiros fãs dos cigarros garantem, naturalmente e com toda a convicção, que o final é que sabe melhor.

O tabaco entretanto produzido é separado em duas partes, uma que se destina diretamente a ser chupada e a outra que fica na ponta do cigarro. Esta parece servir, em especial, para excitar o não fumador, porque é onde estão os constituintes mais perigosos.

É o caso do benzopireno, o carcinogéneo mais forte de entre os que se conhecem, com uma concentração aí três vezes e meia mais elevada do que na outra parte.

A inconsequência da política relativa ao tabaco revela-se no facto de substâncias como o metilo utilizado para dar à manteiga a sua cor amarela, o aminofenol utilizado na medicina e o adoçante ciclamato serem proibidas devido à presença da nitrosamina, que era cerca de mil vezes mais reduzida do que na ponta do cigarro.

Além disso, no tabaco encontra-se também uma componente de gás e de partículas, em que o primeiro é especialmente mais perigoso.

As partículas contém nicotina e alcatrão, que são os malfeitores mais conhecidos, e servem para garantir o gosto (o alcatrão) e a proteção contra os efeitos prejudiciais (da nicotina).

O produto que resulta da condensação e que existe em cada maço corresponde a esta fase, descontando a nicotina e o vapor de água e mantendo o teor de alcatrão. A fase gasosa só contém, na realidade, coisas nocivas: além dos aldeídos, caineto, nitrosaminas e metanol, contém, em especial, monóxido de carbono, que, se é que isso é possível, ainda consegue ser mais perigoso do que o alcatrão e a nicotina.

A reação física dos pulmões ao composto que é chupado faz-se sentir em cada um dos violentos acessos de tosse que cada fumador experimenta com o seu primeiro cigarro. Com esta reação de defesa, o corpo procura travar os elementos que compõem o cigarro.

E esta reação só é controlada por via da habituação.

Dahlke, R. (2011). O livro do fumador. Munique: Pergaminho.