Dieta anti-tabaco

Dieta anti-tabaco

“Que interesse existe – dirá o leitor – numa pessoa se privar de coisas boas durante um período tão delicado como o do abandono do tabaco, com as inevitáveis frustrações que isso lhe pode provocar? O argumento será perentório mas é bastante discutível, pois todas essas «coisas boas» que psicologicamente são muito agradáveis são, na realidade, causas de intoxicação suplementar, como o leitor vai ver.

https://www.saberviver.pt/comida/nutricao/como-ter-alimentacao-saudavel-e-equilibrada/

O homem civilizado dos nossos dias – isto é hoje um facto publicamente notório – está excessivamente comprometido na alimentação: pratica excessos quantitativos e come alimentos de qualidade aberrante. Daí um paradoxo da vida atual: um quarto da população mundial vai engordando e sofrendo de doenças resultantes de uma inadequada alimentação, enquanto os outros três quartos vão morrendo de fome. Não tenho a intenção de filosofar a este respeito, mas pretendo salientar a existência de alguns erros alimentares evidentes e que muito caros nos saem no plano do nosso equilíbrio sanitário – desejo corrigi-los ao menos durante aqueles poucos dias da cura de desintoxicação. A maior parte dos alimentos que hoje comemos são produtos industriais. Concebidos para agradar ao nosso paladar, excitam-nos os sentidos mas não satisfazem as exigências alimentares a que deveriam dar resposta (facilidade de digestão, abundância de vitaminas, de oligoelementos, de sais minerais, fraca capacidade de acumulação de toxinas no organismo…e sempre sabendo bem). Ora a indústria alimentar privilegia atualmente o gosto dos alimentos em prejuízo das suas qualidades nutritivas. Daí o aparecimento de muitas doenças que no início deste século não existiam, pois nesse tempo a alimentação ainda não era tão complicada nem estava tão pervertida no aspeto químico. A alimentação que eu recomendo para o período de desintoxicação – uns oito dias – foi concebida de tal maneira que facilite a desintoxicação geral das células do organismo. Com efeito, a nicotina tem a propriedade de ser solúvel nas gorduras e, portanto, é necessário libertar o mais depressa possível o nosso sistema nervoso e a nossa economia celular da nicotina que contêm. Durante os primeiros dias de privação do tabaco, o corpo irá despender uma grande quantidade de energia para realizar a limpeza generalizada. Uma alimentação simples, e até frugal, facilitará imenso essa operação de «vassourada», que eliminará os diversos venenos celulares e os resíduos nicotínicos acumulados nas células. Além do evidente interesse de uma alimentação não-tóxica para a purificação do organismo, essa alimentação terá como efeito imediato o não introduzir nenhuma excitação suplementar a nível das mucosas gustativas.

A cavidade oral, com efeito, está semeada de terminações nervosas sensoriais que encaminham para o cérebro as sensações gustativas. Ora os centros do gosto, ou sejam que respeitam ao gosto, e aos centros do olfato, ou sejam que respeitam aos cheiros, estão situados em zonas cerebrais vizinhas. Para melhor descondicionar essas áreas centrais, há um evidente interesse em suprimir aos sabores irritantes ou excitantes, intempestivos, e adotar nessa matéria uma certa neutralidade. A entrada em repouso das pupilas gustativas da língua, do palato (que são zonas cruciais, expostas na linha da frente ao varrimento ventilatório do fumo) e das mucosas que atapetam a garganta fará diminuir a intensidade dos fenómenos de irritação que frequentemente se manifestam nos ex-fumadores. Todos conhecem o prazer aumentado do cigarro ou do charuto depois da refeição; esse cigarro ou esse charuto, muitas vezes, é o  «melhor»: aquele em que cada fumaça se extrai a quintessência, em que o aroma do tabaco se mistura aos sabores residuais que ficam na boca ou na garganta.

9 alimentos que ajudam a parar de fumar

De modo que é preciso pôr essas células em repouso. Descongestionadas e acalmadas com uma alimentação neutra, não desenvolverão um processo de irritação persistente que para se apaziguar exige tabaco. O regime que eu aconselho não é, portanto, um luxo: corresponde a uma necessidade fisiológica que é fundamental num programa de desintoxicação. Achará o leitor que seria eficiente se, ao limpar a sua casa, deixasse as janelas fechadas, limitando-se a agitar a poeira com uma vassoura? Uma pessoa não fica lavada se se encharcar de desodorizante. Se, portanto, a sua decisão de deixar de fumar é uma decisão firme, aceitará com facilidade uma coisa que representa apenas uma limitação muito relativa temporária, embora possa ser um ponto de partida para uma útil revisão dos aspetos higiénicos da sua vida. Eis, pois, os conselhos sobre a alimentação a praticar de maneira rigorosa durante os primeiros oito dias.

(continua na próxima newsletter)

Fonte: Roger, Jean Luc; Como Deixar de Fumar; Publicações Dom Quixote, 1984, 71308